domingo, 28 de agosto de 2011

Show de Adriana Calcanhotto dia 2 de setembro no RN


"O Micróbio do Samba", é o nome do show que Adraiana Calcanhotto fará em Natal no próximo dia 2 de setembro, às 21h, no Teatro Riachuelo.
O Micróbio do Samba 

Por Luciano Alabarse

A letra de uma única canção, quando conectada com sua realidade temporal, tem mais força e eficiência do que uma biblioteca inteira. a música popular, ainda hoje, é como farol potente a iluminar o breu dos impasses nacionais, sejam eles comportamentais ou políticos. seu espaço ocupa, por isso, um lugar privilegiado na formação de nossa identidade. os grandes compositores brasileiros se destacam como arautos das mazelas e maravilhas do país. a dívida afetiva aos homens e mulheres que cumprem esse papel, com talento indiscutível, é gigantesca. nós, o público, não poderemos jamais expressar, com palavras exatas e correspondentes, o agradecimento merecido a esses músicos, mas podemos reconhecê-los e nominá-los como vozes especiais aos nossos corações e mentes. 

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Release
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A canção brasileira, de tantos nomes admiráveis, encontrou em Adriana Calcanhotto uma compositora notável, letrista atenta e sofisticada, reconhecida e integrada exemplarmente ao nobre ofício da composição popular. seus versos apresentam uma simplicidade  complexa, pois, muitas vezes, nos oferecem imagens paradoxais, rimas inusitadas, soluções léxicas primorosas. ouvir uma canção de adriana pela primeira vez, para aqueles que o fazem com a devida atenção, é uma experiência estética solar. há humor, leveza e dor, talvez não necessariamente nessa ordem, criando tensões entre palavras e geografias insólitas. a poesia de Adriana é cosmopolita, nascida entre aqueles que têm acesso às informações e à literatura dos grandes agrupamentos urbanos, mas isso por si só não explica seu resultado e eficácia. Nada parece fruto do acaso em seu trabalho. não há uma inteligência paralisante em relação às legítimas emoções de seus versos. uma não contradiz nem nega a outra. a transpiração de sua poesia ilumina a origem emocional dos seus achados poéticos. a aparente facilidade com que se desenvolvem os versos “calcanhottos” mostra um trabalho ao mesmo tempo artesanal e requintado, que está longe de resvalar para a rima fácil, o verso pobre e acomodado à primeira solução.

Há uma inquietação bem-vinda na carreira da compositora. a articulação dos (des)encontros amorosos, ou das opções comportamentais desejantes,  não sofre em sua obra das usuais formas que banalizam essa necessidade comum. Sua poesia anda, literalmente. Um verso de Adriana, o rito de passagem de uma situação à outra, sempre tem mais de um significado, e essa é a verdadeira força de uma poesia real, a chamar seu leitor, ou ouvinte, a também cumprir seu papel criador. Uma letra de música assinada por ela traz garantia de acesso ao misterioso encanto de um verso legítimo,  solicitando cumplicidade e refinamento a quem queira senha de acesso. é preciso aprender a ouvir, a se deixar levar, a se surpreender.

A notícia de que ela dedicaria ao samba um disco inteiro, uma safra inteira de novas composições, é surpreendente e maravilhosa. o samba brasileiro tem uma alegria melancólica, diferente da “alegria triste” da canção romântica brasileira; tem uma evanescência transgressora, uma força pulsante incomparável. o samba é o ritmo mais livre e, por isso mesmo, mais perigoso, reino propício à experimentações instrumentais, o gênero que melhor conjuga tradição e ruptura, qualquer que seja o nível de recepção que emprestemos a ele. não é por nada que ocupa o espaço que ocupa na história brasileira. raízes e antenas são os ingredientes de um samba a ser composto no século xxi. há algo absurdamente vivo e que sempre acontece ao ouvirmos um samba bom. aprendemos, de forma quase concomitante à audição, letra e música. queremos ouvir novamente, e mais uma vez e outra mais, até que aquela canção esteja em nossos corações e corpos, nos levando a gingar e mexer pés e quadris, mesmo os mais reticentes e comportados ouvintes. os espanhóis têm uma expressão especial para falar de seus artistas importantes, dizendo que os verdadeiros criadores artísticos devem estar possuídos por “duende”. no brasil, os verdadeiros sambistas cunharam uma expressão extraordinária para reconhecer aqueles que importam e fazem a diferença, ao afirmar que os mesmos devem ter o “micróbio do samba”  contaminando sua criação. é uma expressão surgida durante a década de quarenta, imortalizada em uma canção de braguinha, gravada por nomes seminais da história do samba brasileiro.

Com esse novo disco, Adriana vai surpreender muita gente - porque, apesar de morar no rio de Janeiro há muitos anos e adorar a cidade que escolheu para viver, quanto mais amadurece como artista criadora, mais mostra traços inequívocos do lugar de seu nascimento, ou seja, o rio grande do sul. o samba de adriana é carioca e gaúcho, e lembra, evolutiva e carinhosamente, um conterrâneo ilustre: lupicínio rodrigues.   essas duas vertentes geográficas e seu temperamento libriano criam canções absolutamente contagiantes e paradoxais. há, de forma original e incontestável, o micróbio do samba nessa safra nova de suas canções. é um passo adiante em sua carreira de compositora popular. lupicínio, o boêmio inveterado, o profeta das dores amorosas mais agudas, certamente iria cantarolar estes sambas protagonizados por personagens de temperamento notívago e apaixonado. essas criaturas vão chorar pelos cantos procurando amores e aventuras, vão descobrir novas ciladas e encruzilhadas afetivas, serão embaladas por convites noturnos ou chamadas diurnas mas, principalmente, vão descobrir a sede e a saúde da alegria, o êxtase dionisíaco e sem amarras. como a própria música de adriana, que parece buscar um estágio de liberdade criativa absoluta.

Por fim, e não menos importante, há que ressaltar a cantora que, a cada dia, está melhor. sua voz cristalina mostra um amadurecimento notável na emissão de seus versos. não há excessos nem contenções demasiadas. eu, que ouvi apenas a gravação das bases dos doze novos sambas, cujos arranjos minimalistas reforçam a força da safra nova de suas belas composições, adianto que estaremos todos a cantá-las remexendo nossos corpos nas cadeiras, sambando no pé,  identificando nossas próprias histórias em seus certeiros achados poéticos. o mundo inteiro ficará mais feliz com esse disco. o micróbio do samba veio para ficar.
Os ingressos estão sendo vendidos na Ecológica (3º piso Midway Mall - Tel.: 3215 8353):
 R$ 80 (inteira) R$ 40 (meia)

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