Saiu no blog da jornalista Thaisa Galvão- Natal/TN
Da Folha de S. Paulo
Namoradinha de infância
Aos 11 anos, novo
papa escreveu carta a sua vizinha Amalia Damonte dizendo que eles iriam se
casar e comprar uma casinha
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES
NAMORADINHA
DE INFÂNCIA
Há 65 anos, Amalia Damonte não vê Jorge Mario
Bergoglio. No entanto, ela conserva viva na memória as lembranças do cardeal
argentino que se transformou no papa Francisco. Por causa de sua proximidade
com Bergoglio, Amalia levou “uma tremenda surra” de seus pais.
Isso foi quando os pais de Amalia descobriram que
Jorge lhe escrevera uma carta na qual dizia que eles iriam se casar e “comprar
uma casinha”. Ambos tinham apenas 11 anos de idade.
“Éramos crianças. Nunca falamos de amor. E ele não
me propôs nada de mau, me propôs um lar”, disse ela.
A mãe da garota, porém, rasgou a carta “em mil
pedaços”, uma atitude que Amalia considera coerente com um tempo em que “a
honra da mulher valia ouro”.
Amalia contou a Jorge sobre a surra e pediu-lhe que
não fosse mais vê-la, interrompendo uma amizade entre “uma menina e um menino
que se gostavam muito” e sedimentaram sua relação com “brincadeiras na rua, na
água e jogos de amarelinha”.
Nessa época, Amalia vivia no número 555 da rua
Membrillar, no bairro de Flores, em Buenos Aires. Só quatro casas separavam a
sua daquela em que Bergoglio viveu até completar 20 anos.
Foi no jardim adornado por um limoeiro cheio de
frutas que Amalia remexeu suas lembranças, diante da reportagem da Folha e
de um grupo de jornalistas argentinos.
Contou que, em orações, pediu para que “Bergoglio
tivesse o que tem” e diz que ele é um homem caracterizado pela “retidão, que
chegou aonde deveria ter chegado”.
Quando o nome do argentino foi anunciado, Amalia
teve uma reação de emoção: “Estava sentada e subitamente me pus de pé. Meu
filho mais velho começou a chorar e disse: ‘Mãe, seu amigo de infância agora é
o papa’”.
Se hoje tivesse um diálogo com Francisco, Amalia
lhe diria: “Sua Santidade, cumpra com a obrigação de seu coração. Sempre tenha
presentes os pobres, como fez em toda a sua vida. Que continue assim e que nada
nem ninguém o entorpeça”.
É o que Amalia diria. Francisco, porém, não ouvirá
essas palavras. Porque a história de Amalia e Jorge terminou junto com a
infância de ambos.
Bergoglio pedia a freiras que saíssem às ruas
Na capela do Colégio Misericórdia de Flores, Jorge
Mario Bergoglio ainda é chamado de Jorgito. Foi ali, em 1944, que ele fez sua
primeira comunhão.
Foi também ali que cursou o jardim de infância e
aprendeu a contar os números, repetindo-os ao subir e descer os degraus.
Irmã Teresa aguardava o cardeal para rezar ali uma
missa no próximo domingo. Seria o encontro anual promovido com as religiosas da
diocese.
Ela sente “o vazio de saber que ele não virá e não
vamos escutá-lo”, mas também a alegria da certeza de que “ele agora é o pastor
de toda a igreja”.
Segundo a irmã, nos encontros anteriores, Bergoglio
sempre insistiu com elas para que “saíssem e caminhassem pelas ruas”, convicto
de que, “se a igreja não sair de si, perecerá”.
Para Teresa, Bergoglio manteve ele mesmo “esse
espírito de escuta” e ofereceu aos que sofrem mais suporte do que até hoje se
soube. “Nunca se divulgou, por exemplo, que, na tragédia Cromañón [o incêndio
da boate que matou 194 em 2004], ele visitou até os hospitais.”
A religiosa gosta especialmente do fato de
Bergoglio haver escolhido o nome de Francisco como papa, em referência a um
santo “humilde, sincero, despojado, mas também muito valente”. (SA).
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